RESOLUÇÃO CAMEX Nº 88, DE 27 DE SETEMBRO DE 2016
DOU 28/09/2016
Esclarece que sapatilhas para kart, confeccionadas em camurça ou em microfibra, identificadas nesta Resolução, quando originárias da China, estão sujeitas à incidência do direito antidumping instituído pela Resolução CAMEX nº 20, de 2016.
O COMITÊ EXECUTIVO DE GESTÃO - GECEX - DA CÂMARA DE COMÉRCIO EXTERIOR - CAMEX, por intermédio de seu Presidente, no uso da atribuição que lhe confere o § 4º do art. 5º do Decreto nº 4.732, de 10 de junho de 2003, e com fundamento no art. 6º da Lei nº 9.019, de 30 de março de 1995, no inciso XV do Art. 2º do Decreto nº 4.732, de 2003, e no inciso I do Art. 2º do Decreto nº 8.058, de 26 de julho de 2013, Considerando o que consta dos autos do Processo MDIC/SECEX nº 52272.001170/2016-81, resolve, ad referendum do Conselho:
Art. 1º Encerrar a avaliação de escopo e determinar que as sapatilhas para kart confeccionadas em camurça ou em microfibra, identificadas nesta Resolução, estão sujeitas à aplicação dos direitos antidumping sobre as importações de calçados da China, instituídos pela Resolução CAMEX nº 20, de 1º de março de 2016.
Art. 2º Tornar públicos os fatos que justificaram a decisão, conforme consta do Anexo.
Art. 3º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
JOSÉ SERRA
Presidente do Comitê
ANEXO
1 DOS ANTECEDENTES
1.1
Da investigação original
No dia 30
de outubro de 2008, a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados,
doravante denominada simplesmente ABICALÇADOS, protocolou petição de início de
investigação de prática de dumping nas exportações para o Brasil de calçados,
originárias da China e do Vietnã, comumente classificadas nas posições 6402 a
6405 da Nomenclatura Comum do Mercosul – NCM, com exceção dos códigos da NCM
6402.12.00, 6402.20.00, 6403.12.00 e 64.03.20.00, de dano à indústria doméstica
e do nexo causal entre estes, nos termos do art. 18 do Decreto no 1.602, de 23 de agosto de 1995. Em 24 de
dezembro de 2008, a ABICALÇADOS solicitou a exclusão do Vietnã como origem a
ser investigada, tendo o Departamento acatado tal solicitação.
A
investigação foi iniciada por meio da Circular SECEX no 95, de 29 de dezembro de 2008, publicada
no Diário Oficial da União (D.O.U.) de 31 de dezembro de 2008. Ressalte-se que
a investigação foi iniciada apenas com relação às exportações de calçados
originárias da China. Em 9 de setembro de 2009, por meio da publicação da
Resolução CAMEX no 48, de 8 de setembro
de 2009, foi aplicado, por até 6 meses, direito antidumping provisório, sob a
forma de alíquota específica fixa de US$ 12,47/par.
A
investigação foi encerrada por meio da Resolução CAMEX no 14, de 4 de março de 2010, publicada no
D.O.U. de 5 de março de 2010, com aplicação, por cinco anos, de direito
antidumping definitivo, sob a forma de alíquota específica fixa de US$
13,85/par, nas importações brasileiras de calçados da China.
Em 5 de
abril de 2011 a ABICALÇADOS protocolou pleito relativo à extensão da medida
antidumping às importações de calçados originárias da Malásia, da Indonésia e
do Vietnã, além da extensão da mesma medida às importações brasileiras de
cabedais e dos demais componentes de calçados originários da China. Esta investigação
foi iniciada por meio da Circular SECEX no 48, de
30 de setembro de 2011, publicada no D.O.U. de 4 de outubro de 2011.
Assinale-se que não foi iniciada investigação relativa às importações de
calçados originárias da Malásia dado que não foram apresentados indícios de que
as importações brasileiras de calçados originárias daquele país tipificariam
prática elisiva.
A
investigação sobre práticas elisivas foi encerrada
por meio da Resolução CAMEX no 42, de
3 de julho de 2012, publicada no D.O.U. de 4 de julho de 2012, com extensão,
por cinco anos, do direito antidumping aplicado às importações brasileiras de
calçados, também às importações de cabedais e de solas de calçados, originárias
da China, comumente classificadas nos itens 6406.10.00 e 6406.20.00 da
Nomenclatura Comum do MERCOSUL - NCM, a ser recolhido em montante equivalente à
alíquota ad valorem de 182%. Ressalte-se que, na ocasião,
não houve comprovação de práticas elisivas nas
exportações de calçados do Vietnã e da Indonésia para o Brasil.
A referida
Resolução CAMEX no 42, de 2012, foi
revogada a pedido da ABICALÇADOS por meio da Resolução CAMEX no 65, de 6 de setembro de 2012, publicada no
D.O.U de 10 de setembro de 2012.
1.2
Da revisão
Em 29 de
maio de 2014 foi publicada no D.O.U. a Circular SECEX no 26, de 28 de maio de 2014, dando
conhecimento público de que o prazo de vigência do direito antidumping aplicado
às importações de calçados comumente classificadas nas posições 6402 a 6405 da
NCM, originárias da China, encerrar-se-ia no dia 5 de março de 2015.
Em 31 de
outubro de 2014 a ABICALÇADOS protocolou no Departamento de Defesa Comercial,
doravante também denominado Departamento ou DECOM, petição de revisão do
direito antidumping aplicado às importações brasileiras de calçados, quando
originárias da China, consoante o disposto no art. 106 do Decreto no 8.058, de 26 de julho de 2013, doravante
também chamado de Regulamento Brasileiro.
Em 2 de
março de 2015 foi publicada no D.O.U. a Circular SECEX no 9, de 24 de fevereiro de 2015, que deu
início à revisão de final de período do direito antidumping em questão.
A revisão
foi encerrada por meio da Resolução CAMEX no 20, de
1o de março de 2016, publicada no D.O.U. de 2
de março de 2016, prorrogando, por um prazo de até cinco anos, o direito
antidumping definitivo aplicado às importações brasileiras de calçados, quando
originárias da China, sob a forma de alíquota específica fixa de US$ 10,22/par.
2 DA SOLICITAÇÃO DE AVALIAÇÃO DE ESCOPO
2.1
Da petição
Em 31 de março
de 2016 a empresa Bersaghi Speed
Comercial Importadora e Exportadora Ltda., doravante denominada Bersaghi ou peticionária, protocolou petição por meio do
Sistema Decom Digital solicitando a realização de
avaliação de escopo em relação a sapatilhas para a prática de Kart com objetivo
de determinar se determinados modelos estariam sujeitos à aplicação do direito
antidumping vigente sobre as importações de calçados originárias da China. Em
20 de abril de 2016, a autoridade investigadora solicitou à peticionária a
apresentação de informações adicionais. A resposta ao pedido foi protocolada
tempestivamente pela Bersaghi em 6 de maio de 2016.
2.2 Do início da avaliação de escopo
Tendo sido
apresentados elementos suficientes que indicavam haver dúvida quanto à
incidência ou não da medida antidumping sobre os modelos de calçados
apresentados pela peticionária, foi elaborado o Parecer DECOM no 21, de 13 de maio de 2016, propondo o
início da avaliação de escopo.
Com base no
parecer supramencionado, por meio da Circular SECEX no 31, de 19 de maio de 2016, publicada no
D.O.U. de 20 de maio de 2016, foi iniciada a avaliação em tela.
2.3
Da habilitação de partes interessadas
A empresa Crocs Brasil Comércio de Calçados Ltda. e a Associação
Brasileira das Indústrias de Calçados - ABICALÇADOS, entidade brasileira
representativa do setor produtivo de calçados, solicitaram habilitação no
presente processo como partes interessadas nos dias 30 e 31 de maio de 2016,
respectivamente. As duas entidades foram consideradas partes interessadas na
avaliação em questão, nos termos do inciso “V” do § 2o do art. 45 do Decreto no 8.058, de 26 de julho de 2013.
2.4 Do encerramento da fase de instrução
De acordo
com o estabelecido no parágrafo único do art. 149 do Decreto no 8.058, de 2013, no dia 21 de junho de 2016
encerrou-se o prazo de instrução da avaliação de escopo em epígrafe. Naquela
data completaram-se os 30 dias após a publicação da Circular SECEX que iniciou
a avaliação de escopo.
No prazo
regulamentar, manifestou-se acerca da avaliação de escopo apenas a ABICALÇADOS,
cujos comentários acerca do escopo da medida antidumping em vigor constam deste
Parecer.
Deve-se
ressaltar que, no decorrer da avaliação de escopo, as partes interessadas
puderam obter vistas de todas as informações não confidenciais constantes do
processo, por meio do acesso ao Sistema DECOM Digital, tendo sido dada
oportunidade para que defendessem amplamente seus interesses.
3 DA DEFINIÇÃO DO PRODUTO OBJETO DO DIREITO
ANTIDUMPING
3.1
Do
produto objeto do direito antidumping
O produto
objeto do direito antidumping é definido como artefato para proteção dos pés
construído com a parte superior, ou cabedal, em material natural ou sintético e
a parte inferior, ou solado, em material natural ou sintético, incluindo
plástico e borracha, voltado para o consumidor masculino, feminino ou infantil
e destinado ao uso diário, social, ou esportivo, normalmente classificado nas
posições 6402 a 6405 da NCM/SH, exportado pela China, conforme descrito pela
Resolução CAMEX no 20, de 2016.
No que diz
respeito ao processo produtivo, este é orientado pelas características físicas
dos tipos do produto objeto do direito antidumping – ou seja, divisão em solado
(parte inferior que suporta o peso do usuário e entra em contato direto com o
solo) e cabedal (parte superior, conectada aos solados ao longo das suas bordas
e que reveste os pés dos usuários) – já que para cada parte existe um processo
de produção específico.
Assim, os
processos de produção de calçados observam normalmente produção por módulos nas
respectivas plantas produtivas e se subdividem em três categorias principais:
(i) fabricação de solados e palmilhas; (ii)
fabricação de cabedais e (iii) montagem, detalhados a
seguir.
Para
fabricação de solados e palmilhas dos tipos do produto objeto do direito
antidumping são utilizados materiais poliméricos (poliuretano – PU, policloreto de vinila – PVC e poliacetato de etileno vinil – EVA, dentre outros) e
aditivos (agentes vulcanizadores, estabilizantes e expansores)
que, por meio de um beneficiamento, atingem a forma desejada pela aplicação. Os
principais beneficiamentos na fabricação dos solados e palmilhas são o corte
dos materiais poliméricos com navalhas e a moldagem a quente com matrizes. Para
algumas aplicações, o material polimérico é previamente conformado por
laminação formando placas planas. O material é então cortado por navalhas em
formatos previamente definidos, visando a sua aplicação na conformação de
solados e palmilhas via processos de termoformação e
prensagem. A moldagem a quente com matrizes é o processo de transformação da
resina polimérica em um produto acabado. A fabricação de solados e palmilhas
pode ser realizada por três processos distintos: termoformação,
injeção ou prensagem.
a. O processo de termoformação
é aplicado na fabricação de solados e palmilhas de EVA. Este processo é
iniciado com a colocação no interior da matriz de uma placa de EVA previamente
cortada por navalhas. As matrizes são fabricadas de alumínio, o que garante
elevada condutividade térmica e peso reduzido, viabilizando dessa forma o seu
transporte manual e aquecimento em fornos. A manutenção do EVA em elevada
temperatura por um tempo determinado possibilita o processo de estabilização no
formato desejado, determinado pela forma da concavidade interna da matriz. Após
o aquecimento, a matriz é resfriada visando à redução da temperatura do EVA, o
que possibilita a retirada da peça pronta da matriz;
b. Já a injeção
ocorre de duas formas distintas, dependendo da matéria-prima. Para PU
(poliuretano) são despejados na matriz dois componentes líquidos previamente
aquecidos. Após a reação de polimerização no interior da matriz, a peça é
extraída já conformada. Para os demais termoplásticos (EVA, TR, PVC, etc.), a
matéria-prima é extrusada (empurrada com alta
pressão) para o interior da matriz, onde ocorre a fusão do termoplástico e o
preenchimento da cavidade da matriz;
c. Finalmente, na
prensagem, o composto polimérico no formato de placas depois de previamente
cortado é colocado no interior das matrizes aquecidas onde é mantido
pressurizado por alguns minutos até a sua estabilização no formato desejado. E
assim é concluído o processo de fabricação de solados e palmilhas.
Já no
processo de fabricação de cabedais são utilizados, entre outros, tecidos
naturais e sintéticos, couros, linhas, ilhoses, fivelas, velcros,
zíperes, gáspeas de PVC, elásticos e adesivos de preparação. Os cabedais são
fabricados, ou montados, a partir de diferentes tipos de processos de
beneficiamento, detalhados a seguir, sendo que o principal é o corte dos
materiais com navalhas.
a. Costura: as diversas partes que compõem os
cabedais, como gáspeas, traseiros, lingueta, etc., são costuradas mecanicamente
entre si. No processo de costura utilizam-se agulhas de diversos tipos (ponta
agulha, ponta bola, dentre outras) e de diversos calibres;
b. Soldagem por alta-frequência: a união de
materiais poliméricos com tecidos visando acrescentar detalhes e enfeite aos
cabedais é realizado via um processo de soldagem por alta-frequência. Neste
processo, um conjunto formado por uma matriz metálica, uma camada de material
polimérico e pelo tecido é posicionado na região de atuação dos raios de
alta-frequência, permanecendo nesta situação por alguns minutos. O tecido do
cabedal é protegido dos raios de alta-frequência por uma lâmina de borracha
que, por sua vez, é revestida por uma camada de tecido de teflon com adesivo;
c. Conexão por adesivos: alguns enfeites são
colados nos cabedais utilizando adesivos (geralmente a base de PU).
Finalmente,
na última etapa do processo de fabricação do produto objeto do direito
antidumping, a montagem, todas as partes que compõem o calçado são unidas,
resultando no produto final acabado. Além do cabedal, solado e palmilha, são
utilizados ainda as palmilhas de montagem ou ensacados e adesivos. Os
beneficiamentos estão relacionados às preparações necessárias para deixar o
cabedal e o solado em condições de serem unidos. O cabedal precisa ser fechado
para que possa suportar a forma de montagem durante a etapa de fixação ao
solado. Isso é feito utilizando uma palmilha especial denominada palmilha de
montagem para os calçados femininos e de ensacado para os tênis. A forma de
montagem garante o tamanho e formato do calçado no momento da união com o
solado. Além disso, serve como elemento estruturante, facilitando o processo de
colagem das partes.
A
preparação para a colagem pode ser realizada em uma ou duas etapas. No caso de
duas etapas, é realizado inicialmente o rebaixamento e a asperação
da parte inferior do cabedal (região de contato de montagem), com o uso de
escovas abrasivas e lixa correia e limpeza da região a ser colada, por meio de
processos específicos, de acordo com o tipo de cabedal, como, por exemplo, pela
utilização de solventes dedicados. No caso de preparação para a colagem
realizada em uma etapa, as ações de rebaixamento e asperação
substituem a limpeza.
Por sua
vez, os solados fabricados com a utilização de matrizes ficam geralmente
impregnados com o desmoldante, que é o produto
utilizado para facilitar a saída do solado da matriz. Esse produto prejudica a
colagem com o cabedal e por isso precisa ser retirado. A sua remoção é feita
via o uso de mantas abrasivas umedecidas com agente limpador (metil etil cetona). Este procedimento é realizado por duas vezes
consecutivas visando garantir a eficiência do procedimento. Depois de removido
o desmoldante, aplica-se uma substância chamada
de primer, cuja função é deixar quimicamente compatíveis
as regiões de colagem. A cura do primer no
solado se dá mediante a ação da lâmpada de raios UV (ultravioleta) sobre a
região de colagem, na qual o primer foi
aplicado.
A montagem
consiste no processo de união do cabedal com a sola e pode ser dividida nas
seguintes etapas:
a. Aplicação da substância adesiva - A
substância adesiva é aplicada nas regiões do cabedal e da sola que serão
unidas;
b. Secagem das substâncias adesivas -
As substâncias adesivas aplicadas ao cabedal e à sola são secadas em fornos
específicos;
c. Reativação da substância adesiva - A
substância adesiva, após a secagem, necessita de reativação, mediante exposição
controlada ao calor e à luz fornecidos por lâmpadas reativadoras;
d. Prensagem mecânica a vácuo - Visando
garantir o tempo e a pressão adequados para a cura da substância adesiva, o
calçado previamente montado é colocado em um equipamento que promove o
pressionamento por vácuo;
e. Resfriamento forçado - O resfriamento do
calçado é necessário para a sua estabilização no formato final;
f. Extração da forma - Uma vez montado o
calçado, a forma utilizada em todo o processo de montagem do calçado pode ser
retirada.
Por fim, os
calçados passam pela etapa de embalagem.
3.2
Dos
tipos de produtos excluídos do escopo do produto objeto do direito antidumping
A Resolução
CAMEX no 20, de 2016, excluiu da definição de
produto objeto do direito antidumping os calçados apresentados a seguir,
classificados nas posições tarifárias 6402 a 6405 da NCM/SH, exportados pela
China:
a. As sandálias
praianas, confeccionadas em borracha e cujas tiras são fixadas ao solado por
espigões (comumente classificadas na NCM 6402.20.00);
b. Os calçados
destinados à prática de esqui e surfe de neve (comumente classificados na NCM
6402.12.00 e na NCM 6403.12.00);
c. Os calçados de
couro natural com a parte superior em tiras, e que encobre o dedo maior,
popularmente designados alpercatas (comumente classificado na NCM 6403.20.00);
d. Os calçados
concebidos para a prática de atividade esportiva, com tachas, grampos,
presilhas, travessas ou dispositivos, ou preparados para recebê-los, inclusive
os calçados específicos e exclusivos para patinagem, luta, boxe e ciclismo;
e. Os calçados
domésticos (pantufas);
f. Os calçados
(sapatilhas) para dança;
g. Os calçados
descartáveis, com solas aplicadas, concebidos para serem utilizados geralmente
uma só vez;
h. Os calçados de
proteção contra a descarga eletrostática (antiestéticos) para uso em
instalações fabris;
i. Os calçados para
bebês e/ou recém-nascidos, com 100% da parte superior de matérias têxteis; e
j. Os calçados com
100% da parte superior e 100% da sola exterior de matérias têxteis.
4.
DO PRODUTO OBJETO DA PETIÇÃO DE AVALIAÇÃO DE ESCOPO
De acordo
com o inciso I do art. 147 do Decreto no 8.058,
de 2013, a avaliação de escopo deverá ser solicitada por meio de petição,
devidamente fundamentada, que conterá descrição detalhada do produto a ser
avaliado, acompanhada dos elementos de prova pertinentes, incluindo suas
características técnicas e seus usos, bem como a sua classificação tarifária na
Nomenclatura Comum do MERCOSUL – NCM, além de explicação pormenorizada das
razões que levaram o peticionário a entender que o produto não está sujeito ao
direito antidumping.
4.1
Da descrição do produto objeto da avaliação do escopo
O produto
objeto da petição de avaliação de escopo consiste em sapatilhas para a prática
de Kart em camurça e sapatilhas para a prática de Kart em microfibra,
originárias da China, sendo, segundo a peticionária, comumente classificadas na
NCM 6403.19.00.
De acordo
com as informações prestadas pela Bersaghi o produto
possui a seguinte descrição:
i. Sapatilha Karting em Camurça: composta de
tecido de camurça com insertos de malha nas laterais e na parte superior para
facilitar a transpiração, sendo o restante composto por microfibra e outros
materiais têxteis. A parte traseira superior é feita em material elástico.
ii. Sapatilha Karting em Microfibra: composta
de microfibra com insertos de malha nas laterais e parte superior para
facilitar a transpiração, sendo o restante composto de material têxtil.
A parte
traseira superior é confeccionada em material elástico para conferir maior
conforto ao calçado. Ainda possui tira com velcro na
região do tornozelo para melhor ajuste. Por sua vez, a sola é especialmente
projetada para Karting, em borracha com ranhuras antiderrapantes.
Segundo a
peticionária, não haveria outras características que pudessem ser consideradas
relevantes com vistas à identificação do produto, bem como não existiriam
normas ou especificações técnicas aplicáveis às sapatilhas para Kart.
O processo
produtivo das sapatilhas pode ser resumido da seguinte forma: na etapa de design os calçados são concebidos e projetados.
Posteriormente, a matéria-prima é cortada com base no que foi definido pela
equipe de design. Esta etapa é sucedida pela
costura, na qual as peças são unidas por meio de costura ou pesponto. Nessa
etapa as peças ainda recebem a aplicação dos bordados. Logo após ocorre a
montagem, na qual o cabedal é fixado à palmilha por meio de colagem ou costura
e ocorrem as operações de colocação de biqueiras ou couraças. O solado é então
fixado ao calçado e, por fim, este passa pela etapa de acabamento com a
colocação de forros, taloneiras, sobre palmilhas,
pinturas e encaixotamento.
4.2
Das razões que levam o peticionário a entender que o produto não está sujeito à
medida antidumping
De acordo
com a Bersaghi, seu objetivo social seria a
importação, exportação, comércio atacadista e varejista de vestuários,
equipamentos e acessórios esportivos e peças para montagem de veículos para
competição a motor. Os produtos seriam importados diretamente e com
exclusividade da empresa italiana OMP Racing.
Para a
peticionária o direito não deveria ser aplicado às sapatilhas para Kart por ela
importadas porque estas não competiriam com as sapatilhas para Kart produzidas
e comercializadas no mercado brasileiro. Ademais, o produto importado seria
dotado de características físicas diferenciadas e seria adquirido pelo público
alvo devido a seu amplo reconhecimento e credibilidade no meio do Kart.
Ainda
segundo a Bersaghi, as sapatilhas para a prática do
Kart seriam calçados absolutamente diferenciados dos calçados objeto do direito
antidumping por serem destinadas única e exclusivamente à prática de atividade
desportiva. Assim, para a peticionária, estaria evidenciado que “não há
Indústria Doméstica no Brasil fabricante deste calçado em virtude da diferença
nas especificações e finalidade de uso, bem como não há concorrência com os
calçados fabricados pela Indústria Doméstica no Brasil”.
4.3
Das manifestações acerca do escopo da medida antidumping
A
ABICALÇADOS, em manifestação protocolada em 21 de junho de 2016, alegou que,
conforme o art. 3o da Resolução CAMEX no 20, de 2016, os calçados classificados na
NCM 6403.19.00 não teriam sido expressamente excluídos da aplicação do direito
antidumping. Contudo, restaria ainda avaliar se a exceção ditada pelo inciso
IV, art 3o, da referida
Resolução englobaria as sapatilhas para Kart. Tal inciso dispõe que o direito
antidumping não se aplica aos “calçados concebidos para a prática de uma
atividade esportiva, com tachas, grampos, presilhas, travessas ou dispositivos,
ou preparados para recebê-los, inclusive os calçados específicos e exclusivos
para patinagem, luta, boxe e ciclismo”.
Segundo a
ABICALÇADOS, apesar das sapatilhas para kart serem consideradas um calçado
esportivo, elas não possuiriam tachas, grampos, presilhas, travessas ou
dispositivos e nem seriam preparadas para recebê-los. Ademais, não seriam utilizadas
para patinagem, luta, boxe e ciclismo. Dessa forma, restaria claro que tais
sapatilhas não se enquadrariam nas exclusões da Resolução CAMEX no 20, de 2016.
Para a
Associação, as características apontadas pela peticionária não indicariam
qualquer diferença entre os produtos importados e os nacionais, sendo ambos
confeccionados com os mesmos materiais. Em relação ao processo produtivo e uso
do produto, alegou que estes também seriam semelhantes, o que permitiria
concluir serem os produtos similares. A ABICALÇADOS apresentou, então,
informações que constam do sítio eletrônico da Corsa Racing, produtora nacional
de sapatilhas para kart, cujo produto possuiria o cabedal em camurça e solado
em borracha, semelhante, portanto ao produto importado. Alegou também que o
produto da empresa Paralego Racing seria visualmente
semelhante ao produto sob análise, gerando a percepção de que o produto também
seria confeccionado em camurça. Ainda foram apresentados os produtos da NP Race Wear, que seria outra
produtora nacional de sapatilhas para kart que fabricaria produtos similares
aos importados.
A
ABICALÇADOS ainda argumentou que, pela descrição do produto fornecida pela
peticionária, não haveria qualquer diferença entre o processo produtivo das
sapatilhas para kart e dos calçados comuns. Alegou ainda que os modelos
voltados aos praticantes de kart não influenciariam a performance ou o conforto
dos praticantes do esporte, apenas comporiam o estilo dos pilotos, e que os
kartódromos não exigiriam calçados específicos para a prática do esporte. A
título de exemplo a Associação apresentou informações do Kartódromo
Internacional de Nova Odessa, no qual seria obrigatória a utilização de
macacão, capacete e balaclava, porém, no caso do
calçado, permitiriam ao piloto utilizar tanto o calçado esportivo quanto alguma
sapatilha.
4.4 Dos comentários
Inicialmente,
quanto à alegação da peticionária de que as sapatilhas para Kart por ela
importadas não competiriam com aquelas produzidas e comercializadas no mercado
brasileiro, a peticionária restringiu-se a alegar que as características
físicas não seriam semelhantes sem, contudo, discorrer sobre quais
características seriam diferentes e o impacto que estas diferenças teriam na substitutibilidade entre o produto importado pela Bersaghi e as demais sapatilhas para Kart produzidas no
Brasil, o que prejudica o argumento apresentado pela peticionária. O mesmo
ocorre em relação à alegada diferenciação pelo uso. A peticionária não explicou
porque considerou que as sapatilhas por ela importadas teriam uso distinto das
sapatilhas para Kart produzidas e comercializadas no Brasil.
No que se
refere ao argumento de que a mercadoria importada seria adquirida devido a seu
reconhecimento e credibilidade e de que as sapatilhas para Kart seriam calçados
diferenciados dos calçados objeto da proteção por meio do direito antidumping
por serem destinados única e exclusivamente à prática da atividade desportiva,
o art. 152 do Regulamento Brasileiro orienta que a análise do produto objeto da
avaliação de escopo será baseada nos mesmos critérios utilizados para definir o
produto objeto da investigação. Estes critérios, por sua vez, são balizados
pelo art. 10 do Decreto no 8.058,
de 2013, transcrito abaixo:
“Art. 10. O
termo “produto objeto da investigação” englobará produtos idênticos ou que
apresentem características físicas ou composição química e características de
mercado semelhantes.
§ 1o O exame objetivo das características
físicas ou da composição química do produto objeto da investigação levará em consideração
a matéria-prima utilizada, as normas e especificações técnicas e o processo
produtivo.
§ 2o O exame objetivo das características de
mercado levará em consideração usos e aplicações, grau de substitutibilidade
e canais de distribuição.
§ 3o Os critérios a que se referem os § 1o e §
2o não constituem lista exaustiva e nenhum deles, isoladamente ou em conjunto,
será necessariamente capaz de fornecer indicação decisiva.”
Dessa
forma, com relação ao primeiro argumento, pela leitura dos dispositivos citados
é possível perceber que é necessário realizar o exame objetivo do produto, o
que não inclui diferenças relativas à marca ou reputação. Já com relação ao
segundo argumento, ao comparar a descrição do produto fornecida pela
peticionária e a definição do produto objeto do direito antidumping, percebe-se
que as sapatilhas para kart utilizam matérias primas semelhantes ao produto
objeto da investigação, notadamente, parte superior em material natural ou
sintético e solado em borracha. Além disso, possuem processo produtivo composto
de etapas similares e possuem aplicações e canais de distribuição parecidos.
Assim, não há como afastar a semelhança entre o produto objeto do direito
antidumping e o produto objeto da avaliação de escopo. A respeito do uso esportivo,
cabe observar que a definição do produto objeto do direito antidumping é clara
ao defini-lo como artefato para proteção dos pés destinado, dentre outros, ao
uso esportivo.
Com relação
ao argumento de que não existiriam no Brasil fabricantes de sapatilhas para
Kart, assevera-se que o argumento não será analisado por não ser pertinente à
avaliação de escopo, cujo objetivo é determinar se um produto está sujeito a
uma medida antidumping em vigor, conforme preceituado no art. 146 do
Regulamento Brasileiro. Destaque-se que o tema relativo à produção nacional de
calçados foi amplamente debatido no âmbito da revisão a que se refere o item
1.2.
No que se
refere aos argumentos da ABICALÇADOS sobre o enquadramento das sapatilhas para
Kart na exclusão a que se refere o art 3o, inciso IV da Resolução CAMEX no 20, de 2016, de fato, as sapatilhas para
Kart, apesar de serem destinadas à prática esportiva, não se enquadram na
exceção pelos motivos já apresentados pela Associação: não possuem tachas,
grampos, presilhas, travessas ou dispositivos, não são preparadas para
recebê-los e não são utilizadas para patinagem, luta, boxe e ciclismo.
Acerca do
argumento da ABICALÇADOS de que os modelos voltados aos praticantes de Kart não
influenciariam o desempenho ou o conforto do usuário, não foram apresentados
elementos que embasassem a alegação, o que prejudicou a análise do argumento.
5.
DA RECOMENDAÇÃO
Inicialmente,
destaque-se que nos termos do parágrafo único do art. 154 do Decreto no 8.058, de 2013, a avaliação conduzida ao
amparo do processo administrativo em questão possui caráter interpretativo, não
alterando o escopo do direito antidumping vigente.
Assim, ante
o exposto, o recomenda-se a publicação de resolução
esclarecendo que as sapatilhas para a prática de Kart estão sujeitas à medida
antidumping em vigor prevista na Resolução CAMEX no 20, de 2016 e, portanto, devem sofrer
cobranças da autoridade aduaneira acerca desse direito.